Esta semana:
Pata de Elefante - Pata de Elefante (2004)*
A simplicidade pode surpreender. Sei que, em se tratando de música, tal afirmativa pode levantar os cabelos de muitos fãs do rock progressivo, assim como tirar aplausos de punks, mas é verdade. E neste primeiro trabalho da banda Pata de Elefante, a simplicidade é surpreendente e gratificante. Nascida em Porto Alegre no ano de 2002, a banda formada por Gabriel Guedes (guitarra e baixo), Gustavo "Prego" Telles (bateria) e Daniel Mossmann (guitarra e baixo) tem como principal característica a versatilidade. E esta, originada por uma necessidade, é a responsável pela primeira surpresa do disco: num só trabalho temos, pelo menos, duas bandas diferentes, com trejeitos marcantes e bem delimitados. E acredite: a idéia é simples.
Muito se espera dos músicos de uma banda que se propõe a ser instrumental. Assim, a dedicação de cada integrante a seu instrumento é levada - em alguns casos - a níveis obsessivos. Entretanto, com o Pata de Elefante, a história foi um pouco diferente. Quando formada, a banda contava com dois guitarristas, mas nenhum baixista. A necessidade deste instrumento levou tanto Gabriel Guedes quanto Daniel Mossmann a repartirem suas atenções entre as guitarras e contra-baixo. E aqui se esconde um dos maiores - e melhores - segredos do Pata de Elefante. Os dois músicos se revezam entre guitarras e baixos durante as quinze faixas do disco, criando, cada um a sua maneira, atmosferas diferentes entre si. A grosso modo, as guitarras mais introspectivas ficam a cargo de Daniel Mossmann, enquanto as "agitadas" são de responsabilidade de Gabriel Guedes.
Segunda surpresa. Há muitas pessoas que simplesmente não gostam de música instrumental. (Mais cabelos em pé, certo?) A falta de voz é capaz de afastar muita gente de boas bandas, e com certeza este deve ser um mal que aflige o Pata de Elefante. Todavia, é preciso atenção para perceber que, digamos, falta alguma coisa nas músicas da banda gaúcha. O power trio explora bem todas as canções sem torná-las chatas. Ou seja, longe de esnobismos e virtuosismos desnecessários, os arranjos são bem feitos, e os músicos mostram suas qualidades nos detalhes de cada faixa. E, além dos três membros, a banda contou com as participações de King Jim (sax), Leonardo Boff (teclado), Luciano Leães (piano elétrico), Lúcio Vassarath (cítara), Alexandre Loureiro e Vicente Guedes (maracás), que preenchem as canções na medida certa. A voz, assim, se faz desnecessária, e os quase sessenta minutos de música passam de uma só vez.
As influências da banda também colaboram muito para que o trabalho seja facilmente digerido. Os anos sessenta e setenta são a principal fonte na qual o Pata de Elefante bebe sua água. Então, não por acaso encontramos o Ventures na faixa "Gato que Late", Hendrix em "Não esqueça o remédio" e Funkadelic em "Pata de Elefante". E essa é a terceira surpresa. Cada uma destas influências é esmiuçada e transformada ao longo do disco, de maneira que é mantida a unidade do trabalho, mesmo com a diversificação de estilos - não apenas musicais, mas dos próprios músicos. Por isso, a transição de uma levada funk ("Funkdelic") para uma surf-music ("Não fique triste") soa natural, e a oposição de estilos não causa estranheza ao ouvinte.
Isto posto, o reconhecimento em festivais como Bananada (Goiânia) e II Super Noites Senhor F (Brasília) é apenas o começo para o Pata de Elefante. Tanto a versatilidade como a qualidade da banda são os ingredientes não apenas para um bom disco, mas para um bom disco instrumental que não cai (como dizem) na mesmice chata de músicas sem fim. As influências são as melhores possíveis, e sua utilização é, em certa medida, equilibrada. A simplicidade que permeia o trabalho do Pata de Elefante dá originalidade ao trio, e esta é a maior surpresa deste disco, pois não são poucas as bandas hoje que andam pelos mesmos anos sessenta e setenta e parecem perdidas no tempo.
* Resenha publicada no site Poppy Corn
A simplicidade pode surpreender. Sei que, em se tratando de música, tal afirmativa pode levantar os cabelos de muitos fãs do rock progressivo, assim como tirar aplausos de punks, mas é verdade. E neste primeiro trabalho da banda Pata de Elefante, a simplicidade é surpreendente e gratificante. Nascida em Porto Alegre no ano de 2002, a banda formada por Gabriel Guedes (guitarra e baixo), Gustavo "Prego" Telles (bateria) e Daniel Mossmann (guitarra e baixo) tem como principal característica a versatilidade. E esta, originada por uma necessidade, é a responsável pela primeira surpresa do disco: num só trabalho temos, pelo menos, duas bandas diferentes, com trejeitos marcantes e bem delimitados. E acredite: a idéia é simples.
Muito se espera dos músicos de uma banda que se propõe a ser instrumental. Assim, a dedicação de cada integrante a seu instrumento é levada - em alguns casos - a níveis obsessivos. Entretanto, com o Pata de Elefante, a história foi um pouco diferente. Quando formada, a banda contava com dois guitarristas, mas nenhum baixista. A necessidade deste instrumento levou tanto Gabriel Guedes quanto Daniel Mossmann a repartirem suas atenções entre as guitarras e contra-baixo. E aqui se esconde um dos maiores - e melhores - segredos do Pata de Elefante. Os dois músicos se revezam entre guitarras e baixos durante as quinze faixas do disco, criando, cada um a sua maneira, atmosferas diferentes entre si. A grosso modo, as guitarras mais introspectivas ficam a cargo de Daniel Mossmann, enquanto as "agitadas" são de responsabilidade de Gabriel Guedes.
Segunda surpresa. Há muitas pessoas que simplesmente não gostam de música instrumental. (Mais cabelos em pé, certo?) A falta de voz é capaz de afastar muita gente de boas bandas, e com certeza este deve ser um mal que aflige o Pata de Elefante. Todavia, é preciso atenção para perceber que, digamos, falta alguma coisa nas músicas da banda gaúcha. O power trio explora bem todas as canções sem torná-las chatas. Ou seja, longe de esnobismos e virtuosismos desnecessários, os arranjos são bem feitos, e os músicos mostram suas qualidades nos detalhes de cada faixa. E, além dos três membros, a banda contou com as participações de King Jim (sax), Leonardo Boff (teclado), Luciano Leães (piano elétrico), Lúcio Vassarath (cítara), Alexandre Loureiro e Vicente Guedes (maracás), que preenchem as canções na medida certa. A voz, assim, se faz desnecessária, e os quase sessenta minutos de música passam de uma só vez.
As influências da banda também colaboram muito para que o trabalho seja facilmente digerido. Os anos sessenta e setenta são a principal fonte na qual o Pata de Elefante bebe sua água. Então, não por acaso encontramos o Ventures na faixa "Gato que Late", Hendrix em "Não esqueça o remédio" e Funkadelic em "Pata de Elefante". E essa é a terceira surpresa. Cada uma destas influências é esmiuçada e transformada ao longo do disco, de maneira que é mantida a unidade do trabalho, mesmo com a diversificação de estilos - não apenas musicais, mas dos próprios músicos. Por isso, a transição de uma levada funk ("Funkdelic") para uma surf-music ("Não fique triste") soa natural, e a oposição de estilos não causa estranheza ao ouvinte.
Isto posto, o reconhecimento em festivais como Bananada (Goiânia) e II Super Noites Senhor F (Brasília) é apenas o começo para o Pata de Elefante. Tanto a versatilidade como a qualidade da banda são os ingredientes não apenas para um bom disco, mas para um bom disco instrumental que não cai (como dizem) na mesmice chata de músicas sem fim. As influências são as melhores possíveis, e sua utilização é, em certa medida, equilibrada. A simplicidade que permeia o trabalho do Pata de Elefante dá originalidade ao trio, e esta é a maior surpresa deste disco, pois não são poucas as bandas hoje que andam pelos mesmos anos sessenta e setenta e parecem perdidas no tempo.
* Resenha publicada no site Poppy Corn